domingo, 4 de outubro de 2009

Entrevista - Florianópolis - Debochando da vida

Mesmo num mercado em que as cantoras de axé music se digladiam para ver quem é a estrela da temporada, em verdadeiras maratonas de vibração e domínio cênico, não há adversária à altura de Rita Lee. E olha que não me refiro a “conteúdo”, “conceito” ou “contribuição para a música popular brasileira”. Nada tão subjetivo assim.

Se você já assistiu a um show de Rita Lee, sabe do que eu estou falando. Caso contrário, tem a oportunidade de conferir a única apresentação de Multishow ao Vivo Rita Lee, que a musa do rock brasileiro faz hoje, no Floripa Music Hall, numa promoção da Itapema FM.

O espetáculo divulga o CD/DVD lançado pela gravadora Biscoito Fino em parceria com o canal de TV por assinatura Multishow. É o marco de um ano da turnê Pic Nic, que estreou no Rio de Janeiro, em 2008, e que percorreu Brasil e Portugal com escala em Florianópolis, ano passado. Nele, Rita Lee recorda antigos sucessos de todas as fases de sua carreira e ainda apresenta canções inéditas.

Aos 62 anos (completa 63 em 31 de dezembro), Rita está, como nunca, em paz com o tempo.

– Eu queria esclarecer que são 43 anos de estrada, tendo como marco zero o ano de 1967, quando Gilberto Gil cantou Domingo no Parque com os Mutantes (banda que ela formou na década de 1960, ao lado de Sérgio Dias e Arnaldo Baptista).

Mas quem acompanha a trajetória da artista sabe que já se vão mais de 46 anos desde que Rita Lee Jones Carvalho estreou nos palcos com o trio Teenage Singers. Sobre o segredo de tanta vitalidade, ela diz:

– A minha estratégia sempre foi a do deboche. Eu debocho do mundo e das pessoas mas, principalmente, de mim. Porque eu adoro ficar em crise. Porque na crise você cria. As pessoas levam a sério muita coisa sem a menor importância. Foi a forma que eu encontrei de segurar a peteca no ar. Dessa maneira tenho conseguido coisas muito boas.

Rita conta que há pouco tempo teve que se submeter a uma cirurgia de hérnia de disco, mas decidiu que esta história de doença não combina com ela.

– Tirei de letra. Não sentia dor, mas fiz uma encenaçãozinha só para ganhar uma dose de morfina. Tem coisas que incomodam como o fígado e a coluna, mais aí eu lembro de todas as loucuras que fiz na vida e vejo que estou bem pra caramba, até bonitinha! Sabe aquela coisa de criança, de ginasial, não sei... É uma mistura de Vovó Donalda com Dercy Gonçalves, gostando de ficar velha.

Desde que a filha do imigrante americano Charles Fenley Jones e da descendente de italianos Romilda Padula decidiu encarar um palco, foram 28 discos de estúdio (sete com os Mutantes e 21 em carreira solo), seis ao vivo, três compactos, duas coletâneas, cinco DVDs e cinco participações especiais em trabalhos de outros artistas. A produção constante, com os altos e baixos naturais em qualquer carreira, garantiu a Rita um público invejável.

– Tem uma moçada adolescente que é muito curiosa e sedenta por música boa. Quando me encontram, conversam como se fossem jovens da minha época. Bate a identificação por causa da letra de Ovelha Negra, que fala da vontade de sair de casa. Também me perguntam sobre os Mutantes: Conta aí... Vocês brigavam muito? Você dava pros dois?

Rita também fala da reação das gerações mais velhas:

– Os quarentões falam dos pais que colecionavam todos os meus vinis. Tem também os cinquentões e os sessentões da minha idade, que chegam de igual para igual. Às vezes, eu observo uma sessentona e digo pra mim mesma: Rita, como você está bem! É que a coisa cai, né? Despenca.

Já as crianças têm outra atitude:

– Eles me chamam de avó, me levam presentes. Teve uma que entrou no camarim e me deu um desenho, eu falei: “Olha que lindo!” Aí ela disse: “Sabe o que é? Você parece a Emília, do Sítio do Picapau Amarelo. Achei the best. Porque, pensando bem, o que vem a ser a Emília? Ela é um personagem que passa de geração em geração. E é isso que eu sou.

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